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8 de mar. de 2012

Poetizar espaços é alargar o tempo


(Mundo Jovem p.8)
Vive-se, hoje, o tempo da não-poesia. O desmembramento entre magia e vida é uma das marcas de nossa era pós-moderna - era de fragmentação e fragilidade, em que a indústria cultural esmaga o ser humano. Em épocas como esta, é contraproducente o viver poético. Não é possível combinar a harmonia da palavra mítica, que rememora o paraíso perdido, ao caos dos dias em que vivemos. É o tempo-flecha, o tempo-ponto, abismado em si mesmo, sem fronteira nem horizontes.



Muitas vezes ouvi: “poesia não vende, para que insistir?”. Insistir é resistir. É ferramenta em nossas mãos. É contrapor-se aos ventos de agora! Coordeno um movimento que publicou 26 obras em três anos, todas de poesia. Apenas três não estão esgotadas. Criamos cooperativa de poetas. Reúnem-se cinco, dez e até mais de 100 poetas. Publicamos, dividimos em cotas e cada um vende os seus livros. Funciona, e é muito bom! Nos lançamentos, vários se reúnem, seguram o tempo nas mãos e controem uma supra-realidade: recitam, falam de suas vidas, criam e recriam o mundo despoetizado. Nossa vitória sobre o mundo mecanizado e capitalista é sorrir diante da obra que retém (no papel) e liberta (para o outro) o nosso dizer poético. A necessidade de se expressar poeticamente está calcada no ser humano desde tempos imemoriais.

Trabalho Inutil ?

Não trabalhar poesia nas escolas, é um reflexo da atual conjuntura. A escola, ainda que nem sempre o assuma, reproduz o sistema autoritário e dual. Há iniciativas (poucas, e algumas brilhantes) no sentido de questionar o sistema, enquanto que a maioria preocupase com a formação do indivíduo, quanto mais individualista melhor, com as arraigadas desculpas de que há poucas vagas, que só os primeiros as ocuparão. Criam-se personalidades descomprometidas com a solidariedade, incapazes de conviver harmonicamente entre diferentes. A escola justifica-se pelos concursos públicos e vestibulares.
Uma vez, orientando uma oficina de poesia na 5ª série, um grupo de mães reuniu-se e, entre outras coisas, pediram para não dar poesia, e dar coisas úteis para o vestibular... Na 5ª série? Fiquei perplexa!
Então, hoje já não é possível brincar com as palavras, educar a sensibilidade para apreciar e escrever, porque existe dali não sei quantos anos um monstro chamado vestibular e, em nome dele, quem sabe, essas mães não quereriam que seus filhos tivessem análise sintática na 5ª série?
Trabalhei numa escola em que se desenvolvia a pesquisa-participante (de verdade) Era lindo! Alunos e professores saíam às ruas, pesquisavam a realidade posta e os anseios daquela comunidade. Num segundo momento, os dados eram tabulados em papel pardo. E que cuidado se tinha para manter in natura a fala dos entrevistados, por respeito à sua forma de se expressar. Uma pesquisa mudava o planejamento de dois anos. Era um constante desafio problematizar as falas na sala de aula e, no final, devolver ações solidarias à comunidade. Mesmo assim, havia colegas que entendiam se uma perda de tempo “aquelas bobagens”. Bobagens que mudariam a vida daquelas pessoas... apenas!
Assim é a poesia para uns: uma bobagem! Palavras que falam pela simples ânsia de dizer que existem, pelo simples fato de serem palavras, sem qualquer outro porquê... Agindo dessa forma, o utilitarismo não consegue raptá-las para seu proveito. Elas fluem, pairam, às vezes veladas e, assim, dizem muito, sem quase nada dizer. Mas a poesia não serve, não cabe neste mundo retificado.
Não serve? Não cabe? E porque será que se lê Camões hoje, passados quase 500 anos? E, ao fazê-lo, sentimos uma grandeza de alma? E há quanto já vão esquecidos os cronistas daquela época? Documentos são questionados. Podem ser forjados. Há teses que se ocupam em saber se Homero realmente existiu, mas ninguém questiona da Idíada e da Odisséia, capazes de instaurar um tempo novo sempre que revistitadas.
A poesia é a extrema liberdade do ser, a palavra inquietante, perturbadora. Um amigo confessou-me: queria livrar-se da poesia. Já não era feliz... A poesia não cria uma geração de alegres sem causa. Cria seres profundos, capazes de ler além da letra impressa, além da palavra dita. Quem lê poesia, escreve poesia, questiona a poesia, não perde a possibilidade de refazer-se constantemente, ir ao encontro de si. E não é essa a arte da vida? A possibilidade de, estando no mundo, interferir criativamente sobre ele?
Então, para que a poesia? Porque ainda há tempo de instaurar no tempo um outro tempo. E é a escola (ou deve ser) a instituição capaz de descobrir a riqueza contida na palavra poética, Num trabalho constante e inquiridor, a escola é capaz de instaurar brisa, desmascarar a hipocrisia do tecido social e criar um ser que cristaliza um outro tempo em suas mentes e corações, contando com o poder transformador da palavra poética.



Edinara Leão,
professora estadual, poetisa,
coordenadora do Movimento VirArte,
em Santa Maria, RS.
Endereço eletrônico: edinaraleao@yahoo.com.br
Blog: http://edinaraleao.blogspot.com

Pelas estradas atuais

Deixar meu livre-ser, ser.
Sem dogmas.
Sem vicitudes.
Ligar-me ao ser interior.
Não negar minha sombra.

Sem pseudo: atitudes e sentimentos.
Andar contra o falso vento.
Ser parte sóbrio parte ébrio.
Voltar a falar de flores.

Ou melhor, o reino interior das cores por de trás das flores.
Se falasse de amores também converteria em cores.
Meu ser não pode ser pelo outro meu ser, aprisionado.
Sei que há um guerreiro e um monge em mim.
Assim como um sonhador, um descrente.
Um anjo e um carrasco.
Um menino e um amante.


:Há boleadeiras, rosetas e flores.


Procuro uma grama para deitar ao sol.
Procuro um canto de natureza que me queime, que me mantenha vivo.
Um pedaço de verde, que viva, mantendo assim em mim a chama da esperança.
Um lugar diferente, onde o silêncio é sagrado.

Leandro Borges - 03/07/10
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